Apesar de não ter ganho grande repercussão na mídia, que ainda festeja os louros da primeira olimpíada da América do Sul, o protesto do etíope sobre as condições de seu povo em seu país, feito ao ganhar a medalha de prata na maratona, valeu ouro.
O maratonista conseguiu trazer à tona uma questão que, como muitas na África, vivem no esquecimento e não são amplamente divulgadas. Talvez o panorama fosse outro se o continente estivesse do outro lado do mediterrâneo, mas isso são "outros quinhentos..."
Fato é que o maratonista, pertencente ao povo de Oromia, relata que o governo etíope persegue, prende e até mata o seu povo por protestarem contra o mesmo. Segundo estimativas, mais de 400 pessoas já morreram desde que os protestos começaram no país.
Infelizmente, esta é mais uma de milhares de histórias de horror que são contatas no continente africano; isso sem contar as que não sabemos. De regimes ditatoriais, passando por guerras civis, sem esquecer do apartheid e massacres de povos por governos, o leque de atrocidades é imenso.
Essa história remete mais uma vez a uma antiga problemática que permeia o continente: as fronteiras artificiais. Que se desenham da seguinte forma:
Culturalmente, a organização das sociedades africanas é bem diferente da nossa (europeia). Enquanto nós nos organizamos em estados, províncias, países e etc. os africanos se organizam em tribos, assim como os indígenas.
Durante o processo de colonização do continente africano, os europeus dividiram o continente (diz a lenda que a divisão foi feita com uma régua sobre o mapa africano, literalmente!) em diversos países, impondo as tribos africanas organizações territoriais diferentes das quais elas estavam acostumados. A questão é que a criação desses países acabou fragmentando tribos por diversos países, como também acabou colocando tribos inimigas dentro de um mesmo Estado.
O resultado dessa receita de bolo mais que explosiva são conflitos que permearam o continente durante décadas. Um deles até virou filme, que já recomendamos neste blog. Trata-se de Hotel Ruanda.
A disputa pelo poder entre tribos rivais, gerou e gera até hoje, conflitos e guerras como a relatada pelo etíope durante sua entrevista após o protesto ao final da maratona.
O maratonista agarrou a imensa oportunidade que teve de jogar um pouco os holofotes para os horrores vividos em seu país e, quem sabe, mobilizar o interesse público sobre mais um caso de violência e morte neste continente que parece ser esquecido pelo mundo.
Mesmo após o protesto, o maratonista agora teme ser morto pelo governo. Pode parecer até exagero da parte dele, mas se pararmos pra pensar que o "foco" da atenção pública ainda se remete aos jogos olímpicos e que Etiópia não é um país que se vê com frequência nos noticiários, a possibilidade disso realmente acontecer, devido ao "esquecimento" da questão, é considerável.
Embora o governo tenha acenado com boas-vindas ao atleta, é uma triste possibilidade que deve sim ser considerada. Ainda mais se levarmos em conta que, até então, não se tinha notícias desse conflito em larga escala e o interesse no mesmo não parece ser tamanho a ponto de acompanhar o desenrolar dessa história.
Esperamos que os "minutinhos de fama" do etíope para expôr a sua causa, sejam mais do que apenas isso; e que os olhos do mundo se voltem para mais este triste capítulo da história deste tão sofrido continente.