quarta-feira, 11 de julho de 2012

Sustentabilidade com a nossa estrutura econômica não dá

Pois é... Nós sabemos que não dá, os políticos sabem que não dá, os chefes de Estado idem... Mas, enquanto a ganância imperar, nada será feito... Ou será que sim ?

Já venho batendo na mesma tecla há tempos: Eco-92, Rio + 20, COPs e todos os outros tratados ou conferências acerca do meio ambiente e em defesa da sustentabilidade não passarão de um jogo de empurra entre chefes de Estado se a nossa estrutura econômica continuar do jeito que está (no famoso olho por olho e dente por dente, onde, continuando o dito popular, todos ficaremos cegos e banguelas...). 

É claro que há pessoas que estão verdadeiramente engajadas em mudar esse modelo, mas são poucas e, consequentemente, têm fraca expressão. 

Contudo, como também insisto em dizer aqui, parece que a corda está apertando em certos pescoços que agora estão tentando correr contra o tempo para tentar mudar esse quadro. Eu explico... 

Todos conhecemos aquela velha equação (que alguns defendem e alguns não) aquecimento global + derretimento das calotas polares + aumento do nível do mar = supressão das cidades litorâneas, ilhas e depressões absolutas. 

Essa pequena equação, da qual você fica livre para concordar ou discordar, tem suscitado certo furor (MEDO é a palavra) em países como Holanda (depressão absoluta), Inglaterra (ilha), Suécia (península)... Que estão vendo a corda apertar no pescoço ou seria a água chegar no pescoço ? Em relação as questões climáticas e ao futuro do planeta (leia-se deles próprios). 

Cabe salientar que nós não ficamos de fora não tá... Lembre-se que a maioria esmagadora da nossa população vive no litoral... Sim; você pode pensar que nós temos terras no interior do Brasil e de fato temos, mas... Teriam elas estrutura suficiente para nos acomodar ? (acho que você já sabe a resposta... Mesmo tendo ciência que este processo, o de inundação das cidades, não ocorreria em 15 segundos e sim um tempo muito maior; sabemos que está questão também esbarra naquela coisinha chamada vontade política... ).

Em virtude disso, alguns países têm se engajado verdadeiramente na busca por uma economia sustentável... O problema é que querem fazer isso sem mudar o modo como produzimos e a estrutura econômica em que vivemos... Não, não estou dizendo para pararmos de produzir, principalmente com tantas pessoas ascendendo socialmente e saindo da miséria; isso seria relegá-los a exclusão novamente... O que deve ser feito é repensar essa estrutura econômica bem como combater o desperdício... Esse último então é essencial... 

Mas então, o que fazer ?... Pois é... Essa é a pergunta que não quer calar... Acredito que o começo dessa resposta esteja na reportagem abaixo da brilhante geógrafa Bertha Becker da qual sou partidário de suas opiniões tanto acerca da Rio+20 quanto do caminho a seguir para mudar o rumo das coisas... 


Bertha Becker é direta em suas frases: “Onde estão as grandes reservas de recursos naturais? Nos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. E as tecnologias estão no norte. Há interesse dos desenvolvidos em ampliar o controle sobre esses recursos”. A objetividade se mantém quando ela comenta um dos pontos centrais da Rio+20: “Economia verde é abertura de novos mercados. O que causa a perda da biodiversidade é a emissão de gases, é justamente a estrutura econômica que aí está”.

Bertha, que há mais de trinta anos acompanha o avanço da pecuária e da agricultura na Amazônia com graves prejuízos para a floresta, destaca sempre o papel do Estado como indutor do desenvolvimento. Nesta entrevista, ela examina os temas da Conferência – a chamada economia verde, a erradicação da pobreza e a produção e o consumo de recursos naturais – e afirma: “O Brasil, em vez de adotar mecanicamente as cartilhas que são apresentadas, poderia construir suas próprias alternativas”.

Desafios do Desenvolvimento - Qual a importância da Conferência Rio+20 e sua expectativa sobre o evento?

Bertha Becker - Não vejo muita força na Rio+20. Os principais governos estão muito preocupados com as próprias dívidas e suas crises econômicas.

Desenvolvimento - Há blocos de países com propostas comuns?

Bertha Becker - Vejo um bloco formado pela Europa, que está muito mal, e a China, muito independente e poderosa hoje. Apesar dela, os Brics formam outro bloco, no qual o Brasil apresenta dados sobre reflorestamento que impressionam, mas as informações estão sendo refeitas por estarem incorretas. Estamos descobrindo que os desmatadores usam artifícios para não serem detectados por satélites. Mantêm as copas de algumas árvores e desmatam por baixo. De qualquer forma, além da redução do desmatamento, temos a ascensão das classes C e D, que também impressiona a comunidade internacional. Talvez o Brasil queira formar outro bloco, com a América do Sul, para manter uma liderança que sempre teve.

Desenvolvimento - Há outros grupos, como o G77, que reúne 131 países em desenvolvimento. Que propostas podem apresentar?

Bertha Becker - Não vejo que tenham grande força. Sob a liderança da Europa, estão tentando sair do conceito de desenvolvimento sustentável para o de sustentabilidade global. Prefiro o primeiro, pois não gosto da ideia do global acima de tudo. Temos que nos preocupar com o global, mas não se pode achar que diferentes países, Estados e regiões do planeta são iguais. Seria bom avaliarmos o quanto essa abordagem interessa ao Brasil.

Desenvolvimento - Há textos seus destacando que, após a década de 1970, o desenvolvimento sustentável passou a ser uma nova feição da geopolítica internacional. A Rio 92 aconteceu em plena ascensão do modelo neoliberal. Já a Rio+20 acontece quando o modelo está desacreditado. Na questão ambiental isso muda alguma coisa?

Bertha Becker - A dimensão geopolítica continua. Há gente honesta, legitimamente envolvida, que se preocupa com os problemas do planeta. E há também interesses geopolíticos. Onde estão as grandes reservas de recursos naturais? Nos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. E as tecnologias estão no norte. Há interesse dos desenvolvidos em ampliar o controle sobre esses recursos.

Desenvolvimento - Há outras disputas a destacar?

Bertha Becker - Sim. A vulnerabilidade dos europeus à elevação do nível do mar e o fato de que os Brics estão retirando populações da miséria. Elas entrarão no mercado de consumo. Há também uma entrada firme do capital nas questões ligadas às cidades. São os casos de saneamento e reciclagem. A meu ver isso cria condições para a reprodução da força de trabalho, pois nunca antes entraram nessa área. O grande problema dos europeus é que se houver realmente o aquecimento global, algumas regiões desaparecem. A Inglaterra é uma ilha. A Noruega e a Suécia são uma grande península cercada por mares. A Holanda já está abaixo do nível do mar. Não é por acaso que esses países comandam a questão global do clima. A maior parte de nossa população está na costa, mas temos alternativas de grandes territórios. Os Brics têm grandes territórios. A Amazônia está se tornando uma área de imigração. Não é por acaso que Japão e Holanda estão fazendo investimentos bilionários para se proteger. No Brasil, mesmo tendo território, deveríamos estar planejando a interiorização.

Desenvolvimento - Podemos aceitar um acordo para reduzir o consumo justamente agora que estamos liberando gente da miséria?

Bertha Becker - Podemos pensar como fazê-lo, mas jamais deixar de incluir. No mundo desenvolvido é preciso mudar padrões de produção e de consumo. Nós aqui temos que mudar os padrões de produção – digo isso há anos em relação à Amazônia – mas será difícil mudar o padrão de consumo.

Desenvolvimento- Outro conceito recente, ligado à ideia de sustentabilidade, é o de economia verde. O que acha dele?
Bertha Becker - Não gosto desse conceito. Dizem que a economia verde está ligada aos três pilares do desenvolvimento sustentável (econômico, social e ambiental), mas na verdade é um pilar meramente econômico. Os textos das Nações Unidas não definem muito bem esse conceito, assim como o de desenvolvimento sustentável. Com uma ideia vaga, a adesão é muito maior, ninguém pode ser contra.
Desenvolvimento - O que está por trás disso?

Bertha Becker - Uma tentativa de superar a crise econômica através da expansão do sistema em múltiplos outros meios e atividades, inclusive sobre os recursos naturais. Poucos fazem a ligação entre a crise econômico-financeira e a crise ambiental. A chamada economia verde representa a abertura de novos mercados, implica tomar conta de recursos naturais e entrar nas cidades. Além de não se fazer a diferenciação entre países, Estados e regiões, ninguém fala nas causas econômicas dos problemas. Antes era tudo ambiental. Agora incorporaram a questão social. Virou socioambiental. Existe a ideia que a ciência e a tecnologia salvarão o planeta. Mas acho muito difícil, se não houver mudanças nas causas da degradação. Nesse sentido não há dúvida que o neoliberalismo ainda impera.

Desenvolvimento - O meio ambiente tornou-se uma questão de mercado?

Bertha Becker - Sim. Já escrevi sobre isso há alguns anos: existe a mercantilização dos elementos da natureza. O que a economia verde quer é tentar superar obstáculos, inclusive da crise, abrindo novas fronteiras. Recursos naturais, produção de energia e, como parte disso, reprodução da força de trabalho. Tanto que estão entrando nas cidades. Ninguém pode ser contra a reciclagem, ao saneamento, mas o que está havendo é abertura de novos mercados. O capitalismo contemporâneo está passando por transformações e tem mesmo que mudar. A pergunta é: Quem vai promover a mudança?

Desenvolvimento - Qual o papel dos Estados nacionais e dos movimentos sociais nessa história? 

Bertha Becker - O Estado tem papel central. Os movimentos sociais e a ciência podem ser aliados, no sentido de demarcar os limites para o mercado. Mas os governos e movimentos sociais sozinhos não têm força e, se o Estado está fraco, os cientistas muito mais. Estão muito afastados da questão sociopolítica, no sentido mais amplo. Ficam muito restritos às suas especialidades. Quem pode criar externalidades positivas para os povos, no meio da trama financeira, são os Estados. No entanto, o complexo financeiro está comandando o mundo. Ninguém toca nisso. Não se trata apenas de salvar o planeta, acabar com as emissões, mas de saber se isso vai resolver o problema dos pobres do mundo. Não gosto da expressão “erradicar a pobreza”. É discurso de Banco Mundial. Nesse sentido, a Rio+20 pode até fortalecer o neoliberalismo. Há um pool de agências financeiras voltadas para a pesquisa. Já financiavam muitas ONGs, agora a carga é sobre a pesquisa.

Desenvolvimento - Há uma unidade entre ativistas e entidades da sociedade sobre os rumos a tomar?

Bertha Becker - Eu acho que houve um grande avanço dos movimentos sociais. Na Amazônia, por exemplo, nunca houve antes movimentos de reivindicação, que, dialeticamente, foram alavancados pela questão da terra, tendo o Estado como grande indutor da migração. Houve primeiro uma grande mobilização em torno da questão espacial, já que o peão é expropriado continuamente da terra, daí essa denominação – ele está sempre “girando” territorialmente. Isso trouxe uma conscientização política. Os assassinatos também. A igreja ajudou muito. Mas se isso será suficiente para enfrentar forças tão poderosas não se sabe.

Desenvolvimento - A perda de poder do Estado não debilita a alternativa do planejamento?

Bertha Becker - Sim. Por isso temos que lutar pelo restabelecimento do papel do Estado, até porque no momento não há perspectiva de nenhuma revolução mais profunda. E o Brasil, em vez de adotar mecanicamente as cartilhas que são apresentadas, poderia construir suas próprias alternativas.

Desenvolvimento - Por onde começar?

Bertha Becker - Primeiro, interromper o desflorestamento. Isso é histórico. A América Latina toda cresceu no processo de economia de fronteira, ou seja, apropriação de mais terra e recursos naturais. Esse padrão tem que mudar. Depois, acabar com o desperdício em todos os setores, não apenas no lixo urbano. De todos os recursos naturais usados, aproveitamos ínfima parte, em todas as atividades. Na construção civil é um horror. Temos ainda que desenvolver tecnologias inovadoras. Não podemos ficar dependentes de importação de tecnologias e financiamentos externos.

Desenvolvimento - Inovar em que direção?

Bertha Becker - No sentido de limpar nossos produtos. O diesel brasileiro é sujo e emite muito mais que o diesel comum. Boa parte da frota de caminhões do Brasil tem média de 50 anos. Teria que ser toda renovada. Há várias coisas fundamentais a fazer, inclusive usando o dinheiro do petróleo. Ou o Brasil desenvolve tecnologia industrial, inclusive para melhorar nossa produção, ou permanecerá dependente.


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