Pelos noticiários, acompanhamos os protestos dos estudantes do Chile que reivindicam uma profunda reforma educacional que o Governo chileno insiste em postergar para o nunca, ou então se propõe apenas a fazer reformas superficiais que em nada atendem as reivindicações dos estudantes.
O Chile é vítima de um processo tipicamente vivido pelos países latino americanos, notadamente nos anos 90: O Neoliberalismo. Contudo, podemos dizer que o processo de transição para o neoliberalismo foi vivido de forma mais intensa, pois o Chile serviu de "laboratório" para os EUA e a Inglaterra, nos anos 80, como forma de ver os cursos pelos quais o neoliberalismo poderia tomar antes de seguir com sua implantação na América Latina.
Com a implantação feita, diversos setores do Governo sentiram, e muito, as mudanças vindas com essa ideologia que pregava o "Estado mínimo". Com a educação não foi diferente.
No Chile o sistema educacional funciona, seguindo as seguintes caraterísticas:
- O Governo investe tanto nas escolas particulares quanto nas públicas. Sendo que as particulares podem exercer o direito de cobrar das famílias pelo educação de seus filhos, e cobram ! E as públicas não podem.
- O serviço de ensino público no Chile é municipalizado, ou seja, não fica sob guarda de um Ministério da Educação, mas sim de responsabilidade dos prefeitos. (podemos perceber aqui o discurso do Estado mínimo se mostrando, já que o Governo Federal não se mostra nem um pouco intencionado em administrar a educação pública).
- Para entrar no respectivo ao Ensino Médio de lá, deve se fazer uma prova, que as escolas particulares se utilizam para acolher apenas os alunos bem sucedidos, deixando aqueles que não obtém notas satisfatórias no mesmo relegados ao ensino público. (podemos perceber aqui uma exclusão social gritante via educação que se faz a partir deste exame).
- As faculdades do Chile exigem taxas de matrículas altíssimas e, mesmo que o governo financie o custeio da faculdade, as formas como esse financiamento é feito são cruéis com quem se submete a eles.
Diante deste panorama assustador, estudantes universitários foram as ruas revindicar melhorias no sistema educacional como Universidade Pública e de qualidade e o fim da municipalização do ensino escolar.
Em 2006, estudantes do correspondente ao Ensino Médio foram as ruas no Chile também lutar por reformas na educação. Contudo, suas reivindicações foram esvaziadas no texto que foi levado a votação, escamoteando assim as verdadeiras reformas que precisam ser feitas.
Infelizmente, vemos não só no Chile, mas em outros lugares da América Latina, e o nosso país não escapa disso, que o neoliberalismo fez estragos em nossa estrutura que serão difíceis de serem contornados a não ser que se lute por elas, assim como os estudantes no Chile estão fazendo.
O governo chileno anunciou na quarta-feira 10 que não apresentará novas propostas às reivindicações dos estudantes que há quase três meses promovem manifestações nas ruas de Santiago e de outras cidades do país. Na semana passada, o governo do conservador Sebastián Piñera apresentou medidas de reforma para o sistema educacional, consideradas insuficientes pelos estudantes. Basicamente, a proposta do palácio La Moneda não contempla os três pontos-chave pelos quais a sociedade chilena tem se mobilizado: uma garantia constitucional de qualidade e gratuidade do ensino público, a proibição do lucro nas instituições que recebem aportes do estado e a desmunicipalização da gestão educacional. Os estudantes sabem por experiência recente que aceitar um acordo de reforma pontual, sem combater as estruturas desiguais do modelo chileno, apenas adiará a discussão.
Em 2006, os alunos secundaristas saíram às ruas exigindo melhorias no sistema e a anulação de um modelo educacional arquitetado durante a ditadura de Augusto Pinochet, no que ficou conhecido como movimento dos pinguins – em alusão ao uniforme dos estudantes da escola básica. Na ocasião, a recém-empossada presidenta Michelle Bachelet criou um Conselho Assessor Presidencial, presidido pelo educador Juan Eduardo García-Huidobro, hoje decano da Faculdade de Educação da Universidade Alberto Hurtado, para agregar todas as propostas de reforma educacional possíveis. Muitas das medidas defendidas pelos pinguins foram esvaziadas quando o texto chegou ao parlamento. Assim, manteve-se no Chile um sistema descentralizado e municipalizado, com permissão para que as escolas privadas que recebem fundos do estado cobrem mensalidades dos pais dos alunos. Nas palavras da pesquisadora aposentada da Fundação Carlos Chagas, Dagmar Zibas, foi um pacto político digno de um Leopardo de Lampedusa: diante da pressão, algumas coisas precisavam mudar para que o status quo permanecesse intacto.
Extraído de cartacapital.com.br