quarta-feira, 7 de julho de 2010

Mineração e Siderurgia no país

Este artigo da Carta Capital traça um belo panorama sobre a siderurgia e a mineração no país no que tange o futuro de ambas sob a regência da maior empresa privada do país, a Vale.

A empresa começa  a dar seus passos na siderurgia mas não larga a sua maior fonte de lucro, a mineração. O problema é que os investimentos na mineração estão pautados em uma falsa segurança que pode se desfazer ao longo dos anos de que o mercado chinês absorverá grande parte do minério de ferro exportado pela Vale; outro problema que se faz presente é a lentidão do grupo em investir na siderurgia, o que permitiria agregar valor ao minério exportado pela empresa além de prover para a mesma um outro mercado consumidor de seus minérios que não somente a China, que seria o mercado interno.

Até porque, de que adianta quase que duplicar a capacidade de produção de minério de ferro se não tiver para quem vender...


Até 2016, a indústrial nacional pode produzir 77 milhões de toneladas
Poucos dias depois de participar da inauguração da Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), o presidente da Vale, Roger Agnelli, fez questão de esclarecer que a participação da companhia no setor deve ser transitória. A maior empresa privada do País tende a continuar a apostar suas fichas na exportação de minério de ferro, a principal matéria-prima para a produção do aço. “A Vale continua focada em mineração. A participação em siderurgia é uma participação de fomento”, disse Agnelli em entrevista a O Estado de S. Paulo na terça-feira 22. Com a declaração, o Executivo mais uma vez assegurou aos acionistas e ao mercado financeiro que a companhia não vai se desviar de sua atividade mais lucrativa, apesar das pressões para que agregue valor ao seu negócio.

Localizada no bairro de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, a CSA é uma das maiores e mais modernas usinas de aço do mundo. No Brasil é o maior investimento realizado no setor desde 1986, quando a Açominas inaugurou sua siderúrgica em Ouro Branco, Minas Gerais. O complexo da CSA engloba dois altos-fornos, porto e uma termoelétrica abastecida pelos gases gerados no próprio processo de produção das chapas. Quando operar no limite de sua capacidade, produzirá até 5 milhões de toneladas de aço bruto por ano. Sua construção consumiu 8,2 bilhões de dólares e empregou cerca de 30 mil trabalhadores. A Vale colocou pouco mais de 2,2 bilhões de dólares na CSA, da qual detém 26,8% do capital. Os 73,13% restantes pertencem à ThyssenKrupp Steel (TKCSA), maior produtora de aço da Alemanha.

Além da CSA, a Vale está envolvida em três novos projetos de siderurgia, com capacidade para produzir mais 13,5 milhões de toneladas de aço. São eles a Aços Laminados do Pará (Alpa), a Companhia Siderúrgica do Pacém (CSP), no Ceará, e a Companhia Siderúrgica Ubu (CSU), no Espírito Santo. Agnelli ainda procura parceiros estrangeiros para tirar todos os projetos do papel, o que vai exigir mais 12,8 bilhões de dólares, mas encontra dificuldades. Por enquanto, apenas a CSP conta com um investidor estrangeiro, a coreana Dongkuk. Especialistas dizem ter dúvidas se a Vale vai realmente levar os projetos adiante se os parceiros não aparecerem. A companhia assegura que sim.

Em contrapartida, especula-se que a Vale tenha planos de investir até 40 bilhões de dólares em novos projetos de minério de ferro nos próximos quatro anos. O objetivo da companhia é aumentar a produção da matéria-prima em 50%, dos atuais 300 milhões de toneladas para até 450 milhões, em 2014. Se a companhia hesita em investir em siderurgia, na área de mineração a ordem é colocar o pé no acelerador. A razão é simples: ao exportar minério para a China, os lucros da Vale são muito maiores. Em 2010, observa Felipe Reis, analista de siderurgia e mineração do Santander, o preço do material subiu 120% em relação ao nível praticado no ano passado. “A tendência é de que os preços se mantenham em níveis bastante elevados pelos próximos quatro anos”, afirma.

Segundo dados da Aço Brasil, o País possuía até a inauguração da CSA capacidade para produzir cerca de 42 milhões de toneladas de aço em seu parque siderúrgico – nos últimos 12 meses, a produção foi de 31,4 milhões de toneladas. Participantes do mercado calculam que o setor pretenda investir até 40 bilhões de dólares a fim de aumentar essa capacidade para 77 milhões de toneladas, em 2016. “No entanto”, pondera Reis, “provavelmente nem todos os projetos já anunciados vão sair do papel”. Além de ser uma atividade menos atraente do ponto de vista do retorno financeiro, se comparada à mineração, a siderurgia brasileira esbarra em questões conjunturais. Anualmente, a China aumenta sua produção de aço em mais de 50 milhões de toneladas – mais do que toda a capacidade atualmente instalada no Brasil. O país atualmente responde por metade de toda a produção de aço do planeta, estimada pela World Steel Association em 1,2 bilhão de toneladas. A maior preocupação dos potenciais investidores é que, num futuro não muito distante, o gigante asiático não consiga absorver todo esse volume. Se isso acontecer, os chineses podem inundar o mundo com aço barato.

Por essa razão, as siderurgias brasileiras tentam atrelar os novos investimentos a parcerias internacionais capazes de assegurar a demanda pelo aço a ser produzido no País. Esse é o modelo adotado na parceria entre a Vale e a Thyssen na construção da CSA. A mineradora brasileira vai fornecer todo o minério de ferro a ser consumido pela nova siderúrgica, um volume estimado em 8 milhões de toneladas. E todo o aço bruto que a CSA produzir será exportado para as unidades da Thyssen na Europa e nos Estados Unidos, onde será realizada a laminação – um estágio mais avançado de processamento.

Acredita-se que outras empresas estrangeiras possam transferir suas fundições para o Brasil, onde os custos e as restrições ambientais são menores, com o objetivo de importar produtos semiacabados e laminá-los em seus próprios países. “Atualmente, só faz sentido investir em uma siderúrgica no Brasil se houver um comprador cativo no exterior. A Usiminas mantém engavetado um projeto de usina para 5 milhões de toneladas, porque não tem uma ponta compradora lá fora”, afirma Pedro Galdi, analista de mineração e siderurgia da SLW Corretora.

Apesar das incertezas, é grande a pressão do governo para que a Vale ajude a desenvolver o setor siderúrgico no Brasil. Especialistas afirmam que a mineradora precisa diminuir sua dependência das exportações para a China, assegurando uma maior demanda interna – dessa forma, a companhia inverteria a vantagem geográfica de que gozam suas principais concorrentes, as australianas BHP e Rio Tinto, mais próximas da China. Para o Brasil, agregar valor às exportações é fundamental para assegurar que o crescimento econômico não esbarre na deterioração das contas externas. Além disso, o País pode se ver obrigado a importar aço no futuro, caso mantenha o ritmo de expansão atual e não invista no setor. Por fim, desenvolver um parque siderúrgico em estados como o Pará, de onde a Vale extrai boa parte de suas riquezas, seria um passo fundamental para gerar empregos e diminuir as desigualdades regionais.

“Há um contraste entre a lógica privada e a lógica do Estado, no caso da Vale. O governo, por meio do BNDES e dos fundos de pensão, que participam do controle acionário da empresa, tenta fazer convergir essas duas lógicas”, avalia Marcelo Pinho, professor do Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Um ex-diretor da companhia, que pediu para não ser identificado, nega que a Vale tenha investido em siderurgia devido a pressões governamentais. Por outro lado, considera legítimo que o Estado e a sociedade pressionem a companhia para agregar valor às suas exportações. “É uma forma de controle absolutamente legítima. No capitalismo contemporâneo, as grandes corporações precisam prestar contas à sociedade e não apenas aos acionistas. Não à toa empresas e bancos privados vão à tevê dizer que são sustentáveis, que investem na cultura popular e ou na preservação do meio ambiente. A sociedade espera que as empresas façam sempre mais do que apenas dar lucro”, afirma.
Extraído de cartacapital.com.br

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